[FH]: O que é a Unlockit e qual é o problema que estão a resolver?

[TD]: A Unlockit é uma empresa Web3 PropTech & GovTech que está a perturbar o mercado ao tornar o processo transacional de compra, venda ou arrendamento de uma propriedade mais digital, simplificado, transparente, colaborativo e seguro para todos os envolvidos, assegurando ao mesmo tempo a total conformidade com as mais recentes legislações da UE (eIDAS, AML6 & GDPR).

O mercado imobiliário não está ligado de forma consistente e os processos empresariais de mediação imobiliária são considerados extremamente ineficientes e opacos. Esta falta de transparência resulta numa falta de confiança entre os diferentes intervenientes, uma vez que muitos deles têm interesses contraditórios. O atual processo de compra ou venda de um imóvel envolve um vasto leque de diferentes intervenientes com diferentes funções e objectivos, o que torna difícil garantir que todos os interesses estão alinhados. Estas forças contraditórias tornam o processo comercial muito ineficaz, dispendioso e moroso. Uma vez que não existe confiança entre as diferentes partes, o processo exige a autenticação de múltiplos documentos, a assinatura de uma miríade de contratos que implicam elevados custos legais, a validação da identidade de cada um e a necessidade de acompanhar de perto o pagamento da comissão, o que, em caso de litígio, implica elevados custos legais. Estes requisitos tornam-se mais difíceis de ultrapassar porque a informação é armazenada em múltiplos silos privados e públicos que não comunicam entre si. Trata-se de um processo quase interminável de autenticação e validação da documentação de cada um. O processo é baseado em papel, o que significa que é difícil garantir a integridade dos dados ao longo de todo o processo.

[FH]: Quando se olha para o seu passado, é muito claro que o empreendedorismo esteve sempre presente na sua vida. De que forma é que as suas experiências anteriores moldaram a sua forma de atuar na Unlockit?

[TD]: Comecei a trabalhar no mercado da tecnologia há 18 anos, quando este era ainda um sector relativamente novo. Tive a sorte de ser contratado para um cargo de gestão numa empresa de consultoria e outsourcing de TI de média dimensão. Subi rapidamente na hierarquia, tornando-me um produtor de topo e um gestor de sucesso. Consegui fazer crescer a minha carreira exponencialmente, acabando por ganhar a ambiciosa posição de executivo C-Level.

Passado algum tempo, comecei a sentir que faltava alguma coisa. Estava a ganhar muito dinheiro, mas não sentia que tinha o controlo da minha vida. Estava sempre stressado e não estava a aprender nada de novo. Eu sabia que queria fazer algo mais significativo com a minha vida. Aos 32 anos, decidi fazer uma mudança radical na minha carreira. Deixei o meu emprego na área da gestão e passei para o lado técnico e de produto da indústria tecnológica. Apesar de não ter qualquer experiência neste domínio, tive a coragem de criar as minhas próprias empresas a partir do zero. Mas estava sempre disposto a sair da minha zona de conforto. Fui um dos três fundadores da RealFevr.com, o hustler e o primeiro CEO do projeto. Estive lá até 2019, o que foi uma experiência fantástica, mas dolorosa.

Tive de aprender com os meus erros e começar a ler sobre tudo. Pude melhorar as minhas competências e conhecimentos e aprendi que a verdadeira felicidade está na jornada de fazer algo significativo e ser melhor todos os dias. Não se trata de chegar a um destino, mas de apreciar o processo de aprendizagem e crescimento.

[FH]: Quais foram os vossos maiores desafios ao criar a empresa e como os resolveram?

[TD]: Os primeiros 18 meses da empresa foram difíceis. Começámos com quatro pessoas, mas, no final, tive de despedir os outros. Não era possível continuar assim. Queria continuar sozinho e foi a decisão mais difícil que já tomei, mas foi a mais correta.

Ouvi o feedback dos nossos clientes e investidores e transformei a empresa numa empresa de web3 e blockchain. A visão permaneceu a mesma, mas o roteiro era completamente diferente. Mantive os nossos clientes existentes e mantive as nossas relações com eles, enquanto passava todo o meu tempo a estudar a literatura científica sobre DLT/blockchain/imobiliário e tokenização. Estava a seguir o conselho do meu mentor, Pedro Roseiro, que me tinha dito que este era o futuro da empresa. Deu muito trabalho, mas valeu a pena. Tudo mudou desde então.

Encontrar o investidor certo foi um dos maiores desafios que enfrentei enquanto fundador. Demorei muito tempo a encontrar alguém que acreditasse na minha visão, energia e experiência, e que estivesse disposto a apoiar o crescimento da Unlockit. No entanto, nunca desisti. Continuei a acreditar em mim e na minha empresa, e nunca duvidei de que seríamos bem sucedidos. Acredito que a coragem é a caraterística mais importante de um fundador. É essencial ser capaz de perseverar perante os desafios e nunca desistir dos seus sonhos e da sua visão.

[FH]: Como vê o papel da literacia financeira na capacitação das pessoas para tomarem decisões informadas quando se trata de comprar, vender ou arrendar propriedades?

[TD]: Acho estranho que as pessoas em Portugal sintam a necessidade de ter uma casa, especialmente num país pobre como o nosso. No entanto, consigo compreender a emoção que está por detrás disso. Afinal de contas, uma casa é um símbolo de estabilidade e segurança. Se queremos comprar uma casa, devemos ter o dinheiro poupado. No entanto, em Portugal, 95% das pessoas recorrem ao crédito para comprar casa. Isto coloca-as numa situação financeira difícil nos próximos anos. Eu tenho 43 anos e não tenho dívidas, e acho que toda a gente devia esforçar-se por estar na mesma situação. Penso que a razão pela qual tantas pessoas em Portugal recorrem ao crédito para comprar casa é o facto de lhes ter sido vendida a ideia de que ter uma casa é a chave para a segurança financeira. Isso simplesmente não é verdade.

Para piorar a situação, Portugal é o país com a mais baixa literacia financeira, o que é dramático.

Por outro lado, não existe uma fonte única de informação credível. Esta é uma das coisas que estamos a tentar resolver. Queremos voltar a dar às pessoas o poder dos dados e desbloquear informações de interesse público, como o valor real das transacções. As pessoas não podem tomar decisões mais informadas sem dados em que possam confiar

[FH]: Enquanto empresário nos sectores proptech e govtech, quais são alguns dos principais desafios que enfrentou para impulsionar a inovação e perturbar os processos tradicionais? Como navega pelas complexidades regulamentares e assegura a adoção pelo mercado das soluções da Unlockit.io?

[TD]: O mercado de proptech é um dos mercados mais tradicionais do mundo. Embora comecem a surgir algumas empresas inovadoras, o sector ainda é largamente dominado pelos intervenientes tradicionais. Isto deve-se ao facto de o mercado imobiliário ser lento a mudar e de as pessoas estarem habituadas a trabalhar da mesma forma que sempre trabalharam. Mudar a mentalidade das pessoas no sector imobiliário é uma tarefa difícil. É preciso tempo e esforço para convencer as pessoas a adotar novas tecnologias e processos. Mesmo que se tenha muito dinheiro, não se pode mudar o mercado de um dia para o outro.

No entanto, acredito que a geração mais jovem será o catalisador da mudança. São mais conhecedores de tecnologia e exigentes do que as gerações anteriores e procuram um processo imobiliário mais fiável, digital e transparente. À medida que se tornam mais activos no mercado, obrigarão os agentes tradicionais a adaptarem-se às suas necessidades. Estou otimista quanto ao futuro da proptech. Acredito que a geração mais jovem vai mudar o mercado para sempre e torná-lo mais eficiente, transparente e acessível a todos.

[FH]: Como é que a Fintech House o ajudou até agora?

[TD]: Não sou o tipo de pessoa que está sempre presente na Fintech House. As empresas em fase de arranque são um exercício diário de execução. Só vou à Fintech House quando tenho um objetivo específico, como foi o caso da reunião com a Lince Capital da última vez que lá estive.

A Fintech House é uma óptima experiência porque me dá a credibilidade de que precisamos. Liga-me aos VC e a outras pessoas do sector, o que dá visibilidade ao projeto. Além disso, a equipa está sempre disponível para ajudar em tudo o que puder, até para abrir portas, o que eu aprecio muito.

[FH]: Na sua opinião, quais são as tendências fintech mais promissoras que poderão ganhar força no mercado português no próximo ano?

[TD]: O sector das fintech está em constante evolução, impulsionado pelos avanços tecnológicos e pela mudança de comportamento dos consumidores. Podemos antecipar um crescimento significativo em várias áreas-chave nos próximos dois anos: IA generativa e aprendizagem automática, plataformas de identidade digital, cibersegurança, blockchain e prevenção de fraudes. Além disso, a longo prazo, a convergência da inteligência artificial e da cadeia de blocos tem um grande potencial e pode ser um passo fundamental para a criação de mercados e ecossistemas mais fiáveis, eficientes e transparentes.

[Entrevista original em https://thefintechhouse.com/knowledgecenter/tiago-dias-founder-of-unlockit/]